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Redpills: Evolução dos INCEL? A origem histórica da misoginia nos fóruns da Internet


Nesse 8 de março de 2023, infelizmente ainda temos muito preconceito a combater... O texto a seguir foi elaborado em conjunto por Victor Portavales Silva e Guilherme Gonçalves de Paiva para debater o assunto que tem ganhado grande repercussão nas últimas semanas.


A temática nomeada Redpill ganhou grande alcance com a circulação de memes, comentários e críticas ao comportamento de Thiago Schutz, uma espécie de ‘coach’ da pegação que administra a página ‘Manual do Redpill’ e espalha o machismo e a misoginia pelas redes sociais. Olhando o percurso do movimento Repdill, podemos ter a ilusão de que se trata de algo novo e recente. Há cerca de 1 ano começaram a circular perfis, vídeos e podcasts voltados para esse nicho. O que pouca gente parece saber ou perceber é que se trata de um movimento quase tão antigo quanto a própria internet, com origem nos famigerados ‘chans’, os fóruns derivados do ‘4chan’.


Já no início do século XXI alguns fóruns da internet se tornaram ponto de encontro de adolescentes e adultos sexualmente frustrados, inseguros e com uma série de desilusões amorosas. Nos idos de Orkut, eram comuns comunidades como ‘caras tímidos’ e similares, onde circulavam manuais de PNL (Programação Neuro-Linguística), textos sobre oratória, muito material de auto-ajuda barata, e conteúdos de gosto absolutamente duvidoso. Enquanto esses materiais se propagavam na ‘superfície’ da Internet, foruns um pouco mais obscuros geravam materiais mais agressivos e diretos, nos meandros dos esgotos do que viria a formar parte da ‘deep web’ ou ‘dark web’.


E é precisamente no 4chan que se inicia um movimento permeado por extremo ressentimento e ódio às mulheres: os chamados INCEL. O termo vem de uma expressão em inglês que significa celibato involuntário (INvoluntary CELibate), que por si só já é reveladora das experiências de vida desses rapazes. Em geral, são homens absolutamente inseguros, com muitas dificuldades para iniciar e manter relações com mulheres, que despejam todas as suas frustrações nas redes, e retroalimentam um ódio que passa a ser coletivo.


O movimento Redpill surge então como uma resposta a essa comunidade. O ‘Redpill’ representa aquele cara que conseguiu superar suas próprias agruras, saiu da posição de ‘beta’ para se tornar um verdadeiro ‘macho alfa’. Isso é algo bastante representativo da ideologia dessas pessoas, que acabam cooptadas por discursos patriarcais e de meritocracia. Sendo assim, passam a vislumbrar a possibilidade de superar suas próprias dificuldades através da ação individual, através de uma melhoria de si, ainda que para isso necessitem objetificar as mulheres.


O que está em jogo é exatamente a mesma questão presentes nas comunidades do Orkut: “Como superar minhas inseguranças e conseguir ter relações sexuais e amorosas?” Mas, ao contrário do que se poderia supor, a resposta dada pela cultura ‘Redpill’ não abre para uma mudança de postura e uma abertura de novas possibilidades de relação consigo e com as mulheres, mas uma radicalização da posição inicial, buscando apenas deslocar o indivíduo de sua posição na cadeia. Ou seja, não é promovida qualquer reflexão. Faz-se apenas uma promessa: de que é possível sair da posição de inferioridade para alcançar protagonismo e sucesso.


Algo que tem chamado a atenção desde o ano passado é o crescimento de coaches redpill. Essas figuras se utilizam dessa ideologia para vender cursos e programas de mentoria para que homens identificados como betas possam se tornar alfas, além de conseguirem criar podcasts de alto alcance. Isso é triste porém muito interessante, pois é possível observar como essas pessoas utilizam de artifícios já existentes na Internet como plataforma de propagação de suas ideias. Essa ideologia, permeada de darwinismo social, neoliberalismo e uma lógica protofascista, se manifesta em um caráter mercadológico, mas também como visão de mundo. Basicamente, tem gente que paga para aprender a ser desse jeito. Chegamos ao ponto em que uma persona se torna um produto, algo que Marx nunca teria imaginado.


Cabe também pensar que a insegurança masculina formou um nicho de mercado, no qual homens aprendem a se tornar sedutores, autoconfiantes e protagonistas. O que há de errado nisso? É estranho pensar que você paga para ter um conhecimento "técnico" que tornará você um modelo de homem autossuficiente. Essa noção de self-made Man que atrela um grande peso de desempenho estético e financeiro à valorização do homem faz com que certos tipos de horizontes políticos e existenciais sejam construídos. A consequência disso é o reforço de certas estruturas já problemáticas no nosso tempo, como o patriarcado, o individualismo, e a própria desigualdade econômica. Esses cursos dão uma ilusão de poder aos homens irrealista, pois os faz esquecer que às vezes a mulher simplesmente é uma outra existência, que também deseja, tem uma história, projetos e autonomia. Também os faz esquecer que existe o acaso, que há circunstâncias que podem fugir ao controle. Em caso de frustração, o desespero poderá afligir esses homens. Essa ideologia não contribui para que essas pessoas sejam capazes de lidar com o mundo, pois não existe nenhum curso que prepare a pessoa para viver.


Ao mesmo tempo, algo bastante preocupante tem ganhado relevo nos últimos tempos: uma certa noção de ciência que vem ascendendo para combater as pseudociências. É uma noção de ciência precisa, pautada na estatística, em um discurso que não se difere muito do positivismo (pois a noção de evidência, advém de elementos concretos ou de métricas do que não é objetivamente observável). Uma linha de ciência que busca precisão e métricas tem o seu valor, o complicado é que por esse modelo se derivar das ciências naturais, talvez certas noções positivistas possam ser problemáticas dentro das pesquisas de fenômenos sociais. Esse tipo de precisão é facilmente emulada por charlatões que podem sem disfarçar de cientistas, com um discurso de autoridade.


 
 
 

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